Série Napolitana

icanthelpbutwonder
2 min readDec 5, 2019

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Me lembro bem quando Elena Ferrante entrou em minha trajetória. Estava arrumando minha mala no quarto de hóspedes da casa de uma amiga em Berlim. Comentava sobre o quanto escrever é natural para mim, pois desde criança sou uma devoradora de livros. Contava para ela que durante a escola cheguei a ser premiada por minha assiduidade à biblioteca da escola. Ela exclamou: “Igual a Lila!”. E assim fui apresentada à uma das protagonistas da série Napolitana. Chegando no Rio, retomei à rotina e acabei me esquecendo dos livros que me foram fortemente recomendados. Mas não é que minha querida amiga comprou e enviou pelos correios para mim? Não tinha mais desculpas para não iniciar a leitura. Outro aspecto interessante me liga à história. Nessa mesma viagem, eu havia conhecido um napolitano, de esquerda e passado dias incríveis com ele. Seu nome? Pasquale (entendedores entenderão).

É um pouco complicado resumir as mensagens que as mais de mil páginas que compõem a tetralogia me trouxeram. A prosa de Elena Ferrante é viceral e vai além do óbvio. Ela consegue com maestria falar de assuntos polêmicos sem utilizar bordões ou defender lados. No decorrer da trajetória de personagens que amadurecem diante das páginas nos deparamos com temas como: o valor que nós apredemos desde novas à atribuir à validação masculina; a relevância que a educação pode exercer na vida de qualquer pessoa — sobretudo mulheres ; sobre o sentimento de não-pertencimento que acompanha aqueles que extrapolam os limites do lugar em que nasceram, sobre a repetição de padrões familiares e na dificuldade de superá-los; a dificuldade que gerações passam para que as futuras possam gozar de uma vida melhor; no desejo feminino por independência asssociado ao próprio trabalho — algo que não devemos esquecer que não nos foi dado sem muita luta; Sobre o excitamento que algumas de nós têm diante do desconhecido, a alegria do novo que é viciante! A excitação quando descobrimos novas possibilidades internas e externas. A sensação de expansão! A descoberta do prazer na solitude quando pela primeira vez rompe-se o limite do perímetro original. A culpa e o inajuste do privilégio diante da dificuldade da maioria. Complexo de Cinderela e Síndrome da Impostora. E tanto, tanto mais!

Consigo enxergar Lila e Lenu como arquétipos e acredito que todas nós podemos ter, em alguma medida, um pouco das duas. A desobediência e a submissão, a inteligência acadêmica e a engenhosidade, a vontade de ir e a necessidade de ficar. Tantas coexistem dentro de nós. Que aprendamos a não excluir partes que nos compõem e que enxerguemos que a união feminina é potente. Nossa inteligência busca saídas não óbvias. Nossa força não é a física, mas a sutil. Vida longa às Lilas e Lenus dentro e fora de nós! As que já foram, as que lutam hoje e as que ainda virão.

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